Sala de Espera…

Sete horas e vinte e seis minutos de uma manhã de qualquer-feira. Trinta e dois. Trinta e dois. Entre os dedos do jovem de chinelos, um pedaço de papel amarrotado. É o meu, moça? Ainda não. O semblante cansado do senhor de camisa azul contrasta com a energia do menino de short vermelho que rasteja por entre os bancos. Trinta e seis. Trinta e seis. Quatro beatas fazem roda na antessala. Nada lhes escapa. Onde já se viu, deixar criança solta assim. E aquela, aposto que está grávida. De novo, completa a companheira. Trinta e nove. Trinta e nove. O enfermeiro de olhos castanhos chama alguém. Ambos discutem. O enfermeiro leva as mãos à cabeça, gira sobre o próprio calcanhar. A palavra lhe para no meio do caminho, algo entre a laringe e os dentes. Um sopro de ódio lhe escapa. Quarenta e um. Quarenta e um. A senhora de óculos bifocais me pergunta onde se pega a senha. Aponto para o lado. Pega para vovó, diz ela para a adolescente que a acompanha. A menina da tranças serpenteia por entre as gentes, cruza com o menino de shot vermelho e retorna com o papel. Setenta e sete, ela me mostra. O seu é qual? Nenhum, eu digo. É que nessa história sou apenas o narrador. A minha frente, outra senhora, a senhora de cabelos brancos. Aproveito o momento para me retirar da trama, cedo meu lugar a senhora de cabelos brancos que de pronto compara sua senha com a senhora de óculos bifocais. Quarenta e três. Quarenta e três. Movo-me para o canto, próximo à coluna. O ventilador range mais que venta. Sob ele, duas garotas conversam animadas. A de brincos de pena mostra a de batom vermelho as fotos do fim de semana. Dois médicos atravessam o saguão. Um deles ajoelha-se para mexer com o menino de shot vermelho. Parecem conhecidos. O outro observa o ventilador. Seu olhar cruza com o do senhor de camisa azul. Há entre eles uma sutil comunicação. Cinquenta. Cinquenta. Meus olhos repousam sobre os rostos de cada uma daquelas pessoas. Tento guardar detalhes. Imagino suas vidas. Me perco em possibilidades de os descrever, de como tramá-los nos meus textos. Absorto, cansado pela espera, meneio a cabeça, como quem busca relaxar a musculatura do pescoço. Num lance, vejo-a colada ao teto. Sua mortalha negra, sua foice polida. Seu rosto se perde na escuridão, mas eu sei que ela sorri. Cinquenta e seis. Cinquenta e seis. Vamos! A voz de minha companheira me tira da hipnose. Demorei muito? Não, não. E antes que engatássemos a conversa sobre como fora a consulta, espreguicei-me como desculpa para olhar mais uma vez para o teto. Lá estava ela. Esteve ali o tempo todo, como eu, observando. Esperando…

#crônicasdeumterráqueo